quarta-feira, 14 de março de 2007

No túnel do tempo.

No túnel do tempo.
Liris Letieres

Não era nem criança, nem era adulta ainda, aquela transição esquisita de idade que a gente não sabe nem pra que time torce. Eu, minha mãe, minha irmã um pouco mais velha que eu, e uma "meio amiga", fomos fazer nossa primeira visita à nova sensação do momento em Salvador, o Shopping..
Antes de começar a história, deixa eu explicar esse caso de "meio amiga".
Ainda não tínhamos criados laços, ela era vizinha recém chegada no prédio, que veio se infiltrando na conversa de minha mãe com a mãe dela:
- Berê (era assim que minha mãe chamava, aquela que seria anos depois, a Tia Bê - tia de "consideração"-, pra mim), vou levar as crianças para conhecerem o Shopping novo, dizem que é um sonho!Artemízia (Tia Miza, consangüínea mesmo!) foi, essa semana e até se perdeu de tão grande!
- Ah, Carminha! Dax, (não estranhem não, é nome verdadeiro, Dax, tempos depois, "Tio Dax") prometeu que ia levar a mim e a Marcinha (eis o nome “da “meio amiga;” Marcinha) para conhecer , e até hoje!
Minha mãe, altruísta que era, prontificou-se a levá-las claro, naquele momento pra todos da cidade era um crime privar alguém de conhecer o lugar mais falado do momento.
_ Se vocês quiserem podem ir comigo! Salpicou minha mãe, Seu Martinho nos levará hoje à tarde.
Eu, assistindo a conversa aos pedaços, porque corria de felicidade, entrando e saindo do apartamento, pra já ir preparando uma roupa a caráter (lembro como hoje: bermuda e blazer brancos com collant azul royal por dentro, não riam não, era moda quentíssima da época) e, avisar minha irmã da novidade. Percebi em uma das minhas voltas, que a Marcinha já fazia o mesmo. Corria porta à dentro do apartamento vizinho e voltava com rosto suado (será que o cabideiro dela era tão alto quanto o do meu guarda-roupa, que tinha que escalar no beliche pra alcançar?).
Mas eis que a Tia Bê, dá uma resposta, que pega a pobre da Marcinha completamente despreparada:
_ Hoje, Carminha? Mas dia de hoje eu tenho que levar a Marcinha para a aula de piano. É o segundo dia de aula, sabe. Mas mesmo assim amiga, obrigada pelo convite.
Não deu outra. No fechar de boca de Tia Bê, foi o exato instante do abrir gigantesco da boca de minha “meio-amiga” Marcinha, aos prantos!
_ Eu não quero ir pra aula de piano! Eu quero ir pra o Shopping!
E chorava convulsivamente!
Tia Bê , tentava conciliar a situação falando da importância das aulas de piano, apelou até pra o alto custo da hora/aula, mas nada! Marcinha não se conformava!
Discussão encerrada, corremos, ambas, para nos aprontar para a tão esperada visita.
Resultado:
Lá se fomos, eu, minha mãe, minha irmã um pouco mais velha que eu, e uma "meio amiga", fazer nossa primeira visita a nova sensação do momento em Salvador, o Shopping.
Descemos juntas, as escadas do prédio (naquela época, poucos prédios com elevadores existiam – o que nos levava a ter mais um grande motivo para irmos ao Shopping, “as escadas rolantes” um mini parque de diversões!).
De olho investigativo nos trajes de Marcinha, para ver se ela estava tão na moda quanto eu, vi que ela estava “completamente por fora”, usando um vestido tipo jardineira e um casaco verde esquisito, amarrado na cintura (que depois eu soube, fora dado pela mãe, pois tinha ar condicionado “forte” no Shopping).
Entramos no carro e, em poucos momentos, cruzamos a Pituba (morávamos na rua Amazonas) e pegamos a via para o Shopping. Descemos do carro com olhares estatelados e curiosos, tanta gente, tanta novidade, tantos blazers com bermudas e collant! Ríamos de tudo! Minha mãe e minha irmã seguravam em nossas mãos e percebi que compartilhavam dos mesmos sentimentos meus e certamente de Marcinha.
Subimos as famosas e divertidas “escadas rolantes” e descemos e subimos e descemos e subimos de novo, era emocionante! Os olhos presos nos degraus para pular o quanto antes da chegada ao andar.
Quando no meio daquela alegria, eu já toda descabelada, suada, amando o Shopping, Marcinha dá um grito!
_Dona Carminha! A Liris se machucou!
Não, eu não havia me machucado. Minha regra chegara pela primeira vez e a roupa branca da moda, nada podia esconder.
Sei, que foi preciso retornar às pressas para o carro, e, ainda hoje eu me lembro: Ai de mim se aquela que eu chamava de “meio amiga”, a Marcinha, não estivesse lá! Nem aquele seu esquisito casaco verde que voltou pra casa, amarrado na minha cintura.

Um comentário:

Anônimo disse...

Passei só pra deixar um bjoooo!